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Guilherme Leme: “Muita gente tem a doença e eu me curei”

06/05/2014 16h35 – Atualizado em 06/05/2014 16h35

Guilherme Leme: “Muita gente tem a doença e eu me curei”

Há um ano, o ator e diretor Guilherme Leme, de 52 anos, se viu em um turbilhão ao descobrir um câncer na garganta e quase morrer por causa de complicações decorrentes de um procedimento médico. De volta ao trabalho, ele conta como superou a doença com otimismo e diz o que aprendeu com a experiência

POR CAROLINA FARIAS; FOTOS DE MARCELO CORREA

Com o mantra “vai passar” Guilherme Leme, 52 anos, enfrentou o pior momento de sua vida, durante o tratamento de um câncer na garganta, em 2013. “Eu gosto de falar da cura”, afirma ele. Acreditar valeu a pena e o ator e diretor, um ano após a descoberta da doença, já está na ativa assinando a direção do espetáculo Trágica.3, que estreia no dia 26, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo, com Letícia Sabatella, Denise Del Vecchio e Miwa Yanagizawa no elenco, e com temporadas programadas também para Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. “Fiquei durante todo o tratamento pensando no trabalho, criando, elaborando”, conta.

Em um sábado ensolarado, Guilherme recebeu QUEM na casa onde mora, em São Conrado, na Zona Sul carioca. Da confortável residência, dá para avistar a Pedra da Gávea e o mar, e foi para lá o seu retorno vitorioso após meses em São Paulo entre sessões de radio e quimioterapia. Por causa de complicações decorrentes de um procedimento médico, ele chegou a ficar 40 dias internado, três deles em coma. Mas tudo é passado. Agora é a hora de retomar a rotina profissional, os encontros com os amigos e de celebrar a vida. “Cada dia, cada ciclo é um novo tempo. Estou em um novo tempo da minha vida”, comemora ele.

QUEM: Como foi a elaboração do espetáculo e de onde surgiu a inspiração?
GUILHERME LEME: São três fragmentos poéticos em cima das três heroínas trágicas: Medéia, Electra e Antígona. Montei o projeto ano passado e ele foi aprovado pelo CCBB. Fiquei durante todo o tratamento pensando no trabalho, criando, elaborando. Quando começamos, estava muito claro o que eu queria. Depois da estreia, vou para Nova York ficar um mês vendo artes plásticas. Serão férias criativas.

QUEM: Você não começou como diretor. Como foi a transição?
GL: Sempre fui muito curioso como ator. Nas montagens de peças, nas gravações da TV, nunca me contentei com a minha parte, sempre estava de olho em tudo. Isso já é uma tendência de diretor. É bem diferente eu estar em cena e estar fora. Gosto dos dois. Mas sou um ator velho e um novo diretor e tudo o que é mais novo na vida dá mais tesão. A direção me excita mais neste momento porque é uma paixão mais nova. Tenho 30 anos de carreira e, na direção, tenho dez anos.

QUEM: Você chegou a parar de trabalhar quando estava doente?
GL: Eu estava em Rock in Rio – O Musical. Estreamos em janeiro e fiz até abril, no Rio. Eu tinha que tomar analgésico para cantar.

QUEM: Como foi a descoberta da doença?
GL: Fiquei com dor de garganta durante dois anos. Uma dorzinha que começou pequena, aqui (mostra o lado direito do pescoço), e foi aumentando. Passei por mais de 20 médicos, mas ninguém descobriu o que era. Fiz todos os tratamentos alternativos que se pode imaginar. A dor ia piorando e eu enlouquecendo. Um dia, fui a um grande médico e questionei se não era câncer. Ele riu e disse que não. Minha clínica geral disse para voltar ao tal médico. Fiz uma ressonância e mostrei a ele, que viu e me disse: “Por que não me procurou antes?”. Ele fez uma punção e uma biópsia rápida, que deu o resultado. Na hora, foi um baque.

QUEM: Você tinha a expectativa de que pudesse não ser grave?
GL: Eu sabia que ia dar merda (risos). Ninguém fica dois anos com dor de garganta e um gânglio daquele tamanho. Mas, quando você ouve, leva um susto porque já visualiza um tratamento de câncer, que não é fácil. Mas eu gosto de falar da cura. Muita gente tem a doença e eu me curei.

QUEM: Como foi o tratamento?
GL: Eu soube em abril de 2013. Estava bravo com o médico que tinha errado o diagnóstico e fui me tratar em São Paulo. Achei uma equipe bacana do hospital A.C. Camargo, chefiada pelo médico Luiz Paulo Kowalski. Me disseram que meu caso não era grave, que tratariam com radioterapia e quimioterapia. Em maio, fiz os exames preparatórios, comecei em junho e fiz até a primeira semana de julho.

QUEM: Esses procedimentos foram dolorosos, trouxeram alguma limitação a você?
GL: Nesse lugar, no pescoço, a radioterapia queima lá dentro. A mucosa inflama e sente-se muita dor para engolir. Chegou uma hora que não conseguia mais comer. Depois da primeira sessão, abaixou a imunidade. Chegamos à conclusão que seria melhor colocar uma sonda de alimentação. Coloquei a sonda e fui para casa na mesma tarde, foi simples como uma endoscopia. Mas, à noite, meu estômago começou a doer. Eu tinha a sensação que ia morrer. Tinha dado um problema com minha sonda. O suco gástrico vazou para o peritônio (membrana que cobre a parede abdominal e as vísceras), deu peritonite e septicemia (infecção generalizada por todo o corpo). Fiquei três dias em coma.

QUEM: Como foi esse tempo no hospital?
GL: Fui operado e acordei dias depois. Aí, foi a parte triste. Fiquei 20 dias na UTI, é muito tempo. É o pior lugar do mundo. O que me salvou emocionalmente foram a minha família e os meus amigos, que foram maravilhosos. Nesse lugar, ter alguém sorrindo para você é a coisa mais importante. Você fica num estado tão fragilizado que só pensa em melhorar. Depois da UTI, ainda fiquei 20 dias no quarto. Nesse período, o tratamento do câncer foi interrompido.

QUEM: Teve medo de morrer?
GL: Eu não sabia, mas podia ter morrido. Fiquei uns três dias meio lá e cá, porque quem tem septicemia pode morrer a qualquer momento. Soube disso depois. Eu, na verdade, nunca tive muito medo da morte. Eu sempre tive medo de sofrer para morrer. E o que aconteceu comigo? Eu não morri e sofri.

QUEM: Qual a primeira coisa que fez quando saiu?
GL: Eu estava na casa dos meus pais, em São Paulo. Fui para o Parque da Aclimação, tirei a camisa e fiquei tomando sol deitado na grama. Até chorei de emoção porque era tudo o que eu precisava.

QUEM: Como foi a retomada do tratamento do câncer?
GL: Operei para depois fazer o resto da quimioterapia. Tudo o que eu pedia para o médico era para não ficar na UTI. Tirei o gânglio e uma lesão muito pequena de dentro da garganta. Deu tudo certo. Quando acordei, Betty Faria estava ao meu lado. No dia seguinte, voltei para a casa.

QUEM: Ficou alguma sequela?
GL: Não, tirando essa cicatriz (mostra o lado direito do pescoço).

QUEM: Os médicos disseram o que pode ter causado o câncer?
GL: Não. Pode ser muita coisa, nunca iria ter a certeza absoluta. O que pode causar é cigarro, álcool, o vírus HPV. O que eles falaram é que para saber exatamente teria que ser feito um exame muito invasivo. Esse momento já passou. O médico disse que depois da radioterapia eu não poderia mais colocar um cigarro na boca. Fumei a minha vida inteira. Fico louco de vontade até… Não é fácil.

QUEM: O que você diria para alguém que está passando por uma situação como essa?
GL: Acredita porque tem cura, vai passar. Eu pensava isso o tempo todo, vai passar. Quando eu sofria muito de dor, quando estava na UTI, era isso na cabeça. Aprendi a ter paciência, eu não tinha, sempre fui muito ansioso. Faz o que tem que fazer, toma o remédio, faz o tratamento, fica no hospital, porque vai passar. Até as coisas boas passam.

QUEM: O que mudou em você depois de passar por tudo isso?
GL: É acordar a cada dia com tesão pela vida. Já que estamos aqui, que estejamos bem. Então, o que aprendi, já que estou bem, é aproveitar e fazer o melhor possível. Cada dia, cada ciclo, é um novo tempo. Estou em um novo tempo da minha vida.

Guilherme Leme: "Muita gente tem a doença e eu me curei"

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